Aqui, Dostoievski inclui um conto impressionante: trata-se de “O Grande Inquisidor”, contado por Iván, o irmão ateu. No fim da Idade Média Jesus desce à terra, em Sevilha. Sem nunca abrir a boca, faz um milagre e as pessoas seguem-no. Mas o velho Inquisidor dispersa as pessoas e manda Jesus para a prisão. À noite, o Inquisidor visita Jesus e faz um discurso dos mais impressionantes no panorama da literatura moderna. Baseando-se nas três tentações de Jesus, o Inquisidor acusa-o de não ter cedido ao demónio, preferindo, assim, a liberdade à segurança, a fé ao milagre, o amor ao poder. Para o Inquisidor, Jesus errou, uma vez que a humanidade só se satisfaz com a segurança, os milagres e a obediência ao poder. Profundamente atual, esse conto apresenta-nos um grande senhor do niilismo “avant la lettre”, o Inquisidor, que não acredita na vida eterna, mas impõe essa crença para que a humanidade não descubra o vazio que a espera e entre numa espiral de revoluções e caos. A esperança é Jesus, o seu silêncio, o beijo que, no fim, dá ao Inquisidor, deixando-o de coração queimado. A esperança, em Dostoievski, reside no mistério do amor, única resposta para a tragédia da liberdade.